terça-feira, novembro 01, 2011

Meu atirador de facas

Pouco antes daquele sábado já estava meio perdida.

_ Pior que duvidar de algo sobre si é duvidar de algo sobre o outro. Essa é a matriz do terror, do medo.

O atirador de facas do meu circo não parece ser tão certeiro agora, não como fora, sorridente, nas apresentações anteriores.

_ Não vamos desistir do nosso número, ele é sublime, ergue a platéia com as mãos no rosto extasiada, gera lucros, vende pipoca, amendoim, nos eleva, nos une.

Naquele final de semana o espetáculo parece ter-lhe descolorido. Entrou sério no picadeiro, sem balançar as facas ou fazer malabares. Enquanto isso eu, a assistente dedicada, passava o aperto de percebê-lo com problemas de vista, problemas em me ver.

A quantos anos ponho meu peito girando diante daquelas facas aceleradas? No meu jogo de dardos eu sempre fui o centro, o cem, o mil nunca acertado. Agora me vejo um borrão, lá pelos vinte, pelos dez, pelos oito e... já fui ferida, tocada pela lâmina. Estaria ele praticando, inserindo mais sangue no número?

Não me importa que pequenos cortes me causem algum torpor, me preocupa perder do circo meu amado, meu atirador.

Pior que ser o alvo, agora percebo, é ser o alvo de um atirador estrábico.

quinta-feira, outubro 20, 2011

Estranho Desjejum

Não poderia ser, meus olhos duvidaram. Mas era. No ar um cheiro de café passando. De mãos dadas ainda, tão cedo, tão perto da minha casa, da minha porta. Só podia ser, eu acreditei com pesar. Tremi. Subitamente o vazio do meu estômago estava rente às cordas vocais, em forma de impulso verbal.
Quando então abri a boca para falar, ou quem sabe gritar... "Pa..." Eles viraram para atravessar a rua e, aliviando-me, não eram. Fora mesmo um golpe de vista, uma ilusão, como se o pesadelo tivesse chegado junto aos aromas matinais.
Acordar e sentir, como desjejum, algo como ciúme, mesmo que de uma ilusão, mexeu com aquele dia.

segunda-feira, outubro 17, 2011

Dica do dia:
_Ordem na vida, sem perder a medida.

segunda-feira, outubro 10, 2011

Estação do Amor Eterno

Nem tão florido ainda, mas anunciada a primavera do meu sentir, torno a ver os bons ventos elevando a folhagem colina acima.
Não como o ciclo das estações, o peito ainda apertado, desejo a eterna estação das mais vívidas cores. Como se parasse o tempo depois de tantos outonos decepcionados. Meu esforço não se vale mais contra os ponteiros, se vale contra os destemperos comuns do inverno em que estive a pouco e que esperançoso vejo esquentando, anunciando o clima do qual não devo mais sair. Agradeço pela serenidade da qual faço uso.
Viver plenamente agora é estar, o quanto puder, em um constante calor de verão, que eu sei que pode esfriar, mas acabar... nunca mais, trago meus novos cobertores.

sexta-feira, outubro 07, 2011

Peito

Aperta filho da puta, aperta... prova que você está aí. Estava com saudades de te sentir, mas não sabia que seria assim. Aperta filho da puta, aperta.

(agora isso aqui virou o meu diário)

sexta-feira, setembro 30, 2011

Uma coisa é certa, me expresso quando estou profundamente machucado, ou divinamente saudável. Mas para ser feliz eu topo até ser mudo.

Veneno


Tendo os pés imersos em veneno de repente é tomado em tramas. Experimenta. Um pulo, um mergulho. Em si o próprio morto. Morto em caos paz não se encontra, nem se pretende. Imerso em veneno não se afoga. Antes morto, intoxicado, a sufocado, de peito apertado. Antes de nada, antes que tudo...

Ele fala, nada escuta. Ele brada, tudo muta. Dor é assim, cura com tempo e tédio ou cura com cicuta.


quinta-feira, setembro 22, 2011

_Eu omiti.

_Omitiu o quê?
_O fato de sentir ciúmes.
_E você tem?
_Tenho, um tanto que me incomoda.
_E você não expressa esses ciúmes?
_Não diretamente.
_Que tal então passar a fazê-lo, com parcimônia é claro?
_E como se faz isso?
_Apenas diga: "Estou com ciúmes", em claro e bom tom.
_Mas daí eu vou assumir meu incômodo.
_Assumir não meu caro, expressar.
_Ao questionar meu amor a prova de tudo constatei que de tudo ele é a prova!

quinta-feira, agosto 25, 2011

Me Compra um dia?

_Um dia inteiro?
_Não, compre a mim, hoje mesmo.
_Hoje mesmo, não poderia ser o dia de amanhã?
_Não seu bobo, eu me vendo e você me compra, hoje.
_Por um dia?
_Por toda a vida.
_Hummm, não poderia ser só por um dia?
_Poxa, tah achando que eu sou prostituta?
_Não! É que eu não tenho tanto dinheiro.
_Então leva de graça, sem precisar de dinheiro.
_Pra toda a vida?
_Hummm, tá bom... Você vem morar comigo?
_Ah não, sua mãe é muito metódica. Vem você morar comigo.
_Na casa que você mora com seus pais?
_Poxa, isso não seria venda casada?
_Casada é o que vai ter que ser.

Desafeto. No colo da solidão. Não deveria estar assim tão só, não sendo quem é. Não há nenhuma obrigação. Afinal quantas seriam as possibilidades? Qual delas seria no lugar da solidão, daquela cadela, parceira infiel a todos os que se entregam solitários?
É dela o lugar que hoje ocupa essa vagabunda. Dela que reage a todas as tais vontades, bem ou mal, de acordo com a vontade, mas isso não importa agora.
A privação da presença chega aos sentidos repentinamente amarga e, também de repente, tudo que deveria ser paz e tranqüilidade se mostra turvo e inquieto. Virando na vida de cá pra lá e vice-e-versa, condicionado a um estranho querer vestido de não pode. Quer! Não deve. Quer! Um pouco? Um tanto? Quer!
Hoje, do sentir, tenho vias que nem em veias se tornam versos. Daí escrevo prosa e vou afastando-me de mim pra ver se enxergo como um todo. Não adianta. Faltam-me meus próprios olhos. Os teus que me destes um dia para que eu pudesse ver minha alma... Aquela que sem você há muito tempo não percebo.

quarta-feira, agosto 03, 2011

Dica do Dia

A menos que você esteja num berço dourado, o prazer vai ser aquilo que vão comprar na sua mão a preço de banana. Caso contrário, você terá muitos fornecedores. Sendo assim, arranje algum dinheiro, ou torne-se imediatamente budista e livre-se logo dos desejos.

segunda-feira, maio 02, 2011

EN NOIR


Erguidas imponentes diante dos olhos, hormônios tomando o cenário, cintadas vestes em frenesi rebolam enquanto, emocionado, canto acompanhando a ligeira batida, a que doma as massas em uníssono pisoteado.
Assim, trotando no crepúsculo, entre brasas e tragos, vão todas, pelo ritmo tocadas, as tantas ideias em foco, as que sob a luz eminente do próximo instante, nutrindo as notas da falante corda, guiando tudo no passo prático da zabumba, vão ao encontro febril das mil artérias ali infladas.
Nos sentidos fabricados em modo fast food tropeços e processos livres de culpa. 
Daí, a metáfora da meia noite à meia lua, lá pelas duas, tudo contempla. E da melhor forma estaria eu de cá sonhando ao som da toada de tantas almas abruptamente geminadas.

segunda-feira, março 14, 2011

à prova.

Questiono meu amor, que se diz à prova de tudo, só pra saber se de tudo meu amor será a prova.

domingo, fevereiro 13, 2011

Agatha e Igor

_ Você pinta flores?

_ Eu não gosto de pintar.

_ O que você faz?

_ Eu desenho.

_ Hummm... você desenha flores?

_ Não.

_ Por que?

_ Porque eu gosto mais de desenhar gente comum, mulher nua, máquinas, cartoon...

_ A ta, mas e se eu te encomendar uma pintura de flores?

_ Bem, a um bom preço... sim eu pinto.

_ Você nem mesmo gosta de pintar, mas por dinheiro você pinta?

_ Até flores.

_ Você então está se vendendo.

_ É, é isso mesmo. Estou cobrando pela minha capacidade de representar. Coisa que você não tem.

_ Eu posso ter. Não sou diferente de você.

_ É sim. Se você soubesse fazer não teríamos essa conversa.

_ Se eu soubesse eu nunca iria me prostituir.

_ Nesse mundo, meu anjo, ou você vende e come, ou não vende e é comido.

_ Essa condição não te deprime?

_ Deprime, mas eu prefiro me deprimir de barriga cheia. Você não?

quinta-feira, fevereiro 03, 2011

Tropeço

Tropeço

by Mateus Marques on Wednesday, February 2, 2011 at 10:54am

Enquanto os olhos tocavam as curvilíneas formas daquela beldade eu mal podia pensar que, justo naquele instante ímpar de extrema contemplação, haveria um top...

Um tropeço que acabou me atirando a cabeça no poste metálico logo a frente. Imprevistos arquitetônicos. De um lado uma construção divinal da natureza, o supra-sumo bio-dinâmico, do outro a massa fria e sólida do caminho tortuoso.

Na memória uma excitação, um "AI!" envergonhado, um supercílio sangrando e um sorriso...

Tudo isso misturado com o impacto fez do poste a beldade, do sorriso o caminho, da dor o olhar, de mim um trapalhão...

De consciência refeita, segundos depois do impacto, ela estava lá, ainda magnífica e ainda sorrindo.

Bem, ela riu. Já é um começo.